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A Química é a ciência da vida real…ou seja, tudo o que nos rodeia tem algum princípio químico, desde os plásticos existentes nas nossas casas, aos fármacos, combustíveis e até mesmo uma simples peça de roupa de poliéster contem um princípio químico. Na maioria dos casos a produção desses mesmos materiais é desenvolvida num conteúdo extremamente poluente e a sua produção a nível industrial, em massa, promove um conceito muito depreciativo do trabalho de um químico, intitulando-o de poluente, tóxico e nocivo, degradando o que nos rodeia e é único. Este conceito radicalista não é desprovido de fundamento e recordo lamentavelmente, o acidente decorrido em Seveso, Itália, em que a libertação de substâncias extremamente tóxicas para o ambiente provocou efeitos nefastos aos habitantes locais, tal como outros acidentes gravíssimos que ocorreram em refinarias, centrais nucleares ou qualquer outra unidade química.
A necessidade da correcção e de certa forma punição perante a avaliação global do que nos rodeia fez com que os químicos centrassem as suas atenções neste problema e desenvolvessem um método de trabalho que fosse vantajoso para ambas as partes. É nestas condições que surge assim um termo inovador e sugestivo, designado de Química Verde ou Sustentável e que visa sobretudo minimizar e até mesmo anular os efeitos negativos traçados no contexto ambiental produzidos, nomeadamente pela indústria química.
A prática desta ideia necessária teve início nos Estados Unidos com a Lei de Prevenção à Poluição de 1990, lei essa que estabeleceu uma política nacional para prevenção ou redução da fonte de poluição, combatendo na sua origem. A ideia de conceber estratégias criativas para a protecção da saúde e do meio ambiente ou melhorar produtos químicos e processos tornou-se fundamental e expandiu-se o conceito ao nível global. A redução da poluição na fonte, é, segundo a lei referida, “fundamentalmente diferente e mais desejável do que a gestão de resíduos e controle da poluição”.
A partir desta ideia inovadora foram realizados programas-modelos e oferecidos subsídios para desenvolver projectos de pesquisa e desenvolvimento que incluíssem a prevenção da poluição na síntese (produção) de produtos químicos. Foram estabelecidas parcerias importantes com a comunidade académica, o sector industrial e outras unidades governamentais e não governamentais para promover a dita Química Verde. É importante salientar que as estratégias para a implementação dos modelos referidos passam sobretudo pela utilização de matérias-primas renováveis, pela obtenção de processos limpos, sem produtos secundários e por um consumo mínimo de energia com utilização consequente de métodos que utilizem quantidades reduzidas de aditivos.
Para ter uma ideia global do teor poluente que a indústria pode apresentar note-se que, por exemplo, quase 2 biliões de quilos de ácido adípico são necessários em cada ano para o fabrico do nylon (fibra sintética utilizada em carpetes, automóveis, roupa e tapeçaria), poliuretano (utilizado para o fabrico de adesivos, tintas e borrachas), lubrificantes e plastificantes.
Como material de partida para a síntese do ácido adípico trabalha-se com benzeno (material derivado do petróleo que é cancerígeno) e com ácido nítrico concentrado, bastante corrosivo. Este processo é realizado através de várias etapas de síntese e produz como produtos secundários gases muito poluentes, como o dióxido de carbono que provoca o efeito de estufa e, consequentemente, provocando o aquecimento global. Evocando o conceito de Química Verde referido foram estudadas sínteses (processos químicos) alternativas para minimizar o problema do fabrico do ácido adípico, sendo uma delas o uso da glicose (um açúcar comum) como matéria-prima renovável.
A nível nacional, lembrando a indústria têxtil, existem já alguns exemplos de técnicas aplicadas em processos, tais como a utilização de peróxido de hidrogénio (a tão comum água oxigenada) como agente de branqueamento em substituição do hipoclorito de sódio que se usa, por exemplo, nas lixívias, reduzindo assim a carga poluente.
Existe pelo menos uma empresa Portuguesa com certificado ecológico, isto é, opera na garantia de ausência de quaisquer substâncias nocivas nos seus produtos. Agora a análise efectuada à questão depende do ponto de vista, ou seja, será que devemos ficar contentes por Portugal já ter empresas certificadas ou tristes por saber que tem apenas uma ou poucas mais? Em comparação, actualmente, a Suíça e a Espanha são os países com maior número de empresas com certificação ecológica. Quando iremos deixar de ter uma mentalidade inferior e começar a apostar naquilo que realmente é sinónimo de evolução e deixarmos de nos preocupar com temas banais que não nos levam a lado nenhum!
Apelando ao bom senso e a uma consciência cívica robusta é de facto possível preservar o que temos e nos suporta, sublinhando que a mobilização a nível mundial para este problema deve ser total e é extremamente importante que haja recursos financeiros para actividades de pesquisa e desenvolvimento de processos químicos viáveis, pois não bastam o conhecimento químico básico nem o trabalho de profissionais competentes e criativos.
A utilização efectiva e quotidiana da química verde é assim o grande desafio a ser vencido.
Por
Carolina Marques*
* Investigadora do Centro de Química de Évora (CQE)
Publicado no Jornal "Diário do Sul" em 19/02/2008
Disponível no Jornal On-Line da Universidade de Évora (UELine)
Carolina Marques*
* Investigadora do Centro de Química de Évora (CQE)
Publicado no Jornal "Diário do Sul" em 19/02/2008
Disponível no Jornal On-Line da Universidade de Évora (UELine)
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