A Química vista por...Luciano Alvarenga*




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A Química e os desafios da contemporaneidade


Evidentemente são inúmeros os benefícios que os avanços tecnológicos, nomeadamente no que toca ao emprego industrial e agrícola da química, trouxeram ao homem na contemporaneidade. Muitas utilidades presentes em nosso dia-a-dia decorrem desses avanços, sem contar as contribuições feitas no campo da saúde. A tecnologia química ajuda o homem a prevenir e remediar uma série de doenças para as quais, há algumas décadas, não havia sequer possibilidades efetivas de tratamento. Entretanto, não são poucos os desafios que se colocam à química neste início de século XXI; questões globais que envolvem interesses de toda a sociedade, como mudanças climáticas, ecodesenvolvimento e produção de energia sustentável (i.e., sem gerar impactos irreversíveis sobre os sistemas naturais), promoção de uma agricultura sustentável, segurança alimentar e qualidade da água, estão na pauta dessa tecnociência.
Para Terry Renner, diretor-executivo da União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC), a Química precisa se aproximar da sociedade, para oferecer propostas de soluções para problemas e desafios atuais. Para ele, a ciência pode apresentar alternativas em face das questões atinentes à qualidade das águas, produção de alimentos, saúde, produção e energia e promoção de formas sustentáveis de desenvolvimento. Quanto ao último tópico, a chamada “Química Verde”, baseada na concepção de produtos e processos químicos sustentáveis, tem a desempenhar um papel de grande relevo para a promoção das estratégias de ecodesenvolvimento.

Entrementes, enquanto tais avanços não ocorrem, é preciso que os Estados-Nações, em cooperação com entidades internacionais, induzam os diversos setores da indústria química a observarem, em seus processos produtivos, os princípios da prevenção, precaução e responsabilidade-reconhecidos por regulamentos internos e internacionais de Direito Ambiental. Certamente, a transformação pela qual a Química deve passar tem, para além de um significado tecnológico (a melhoria da eficiência ecológica de processos produtivos, p.ex.), um sentido ético, sobretudo à face das irreversibilidades ecológicas que a indústria química pode e tem vindo a gerar. A esse respeito, é necessário ter em consideração, como adverte o jurista belga François Ost (1995: p. 109), o fato de que: “as intervenções humanas, que são cada vez mais maciças e mais concentradas no tempo, interrompem os ciclos naturais e, pelos seus efeitos cumulativos, aproximam-nos dos limiares da irreversibilidade. [...] Independentemente, mesmo, da tomada em consideração das perturbações humanas, a ciência ecológica está mais consciente do que antes, da irreversibilidade do longo tempo da natureza: a natureza, como a história, nunca se repete; é apenas a nível da percepção humana que se forma a impressão de retorno do mesmo [statu quo ante]”.
Destaca-se, dessa perspectiva, a interação que tal ciência deve manter com as demais, visando à realização do “ecodesenvolvimento”, conforme a teorização de Ignacy Sachs (1993, p. 24-24). Enfatiza-se o papel da Química como fator-chave para assegurar de três das cinco dimensões do ecodesenvolvimento, a saber: (1) social-destacando-se o papel de tal ciência para a redução da pobreza e das disparidades sociais; (2) económica-atinente à manutenção da capacidade produtiva dos ecossistemas; (3) ecológica-relativa à preservação dos ecossistemas e, nomeadamente, da biodiversidade. Não são poucos nem simples, portanto, os desafios que a Química tem diante de si. Compreende-se que ela terá sucesso nesse percurso à medida que mantiver a humildade e a capacidade de dialogar com outros setores do conhecimento humano-nomeadamente os de cunho social (Economia, Direito, Sociologia, etc.)-, visando à construção de um saber interdisciplinar, e progressivamente transdisciplinar, para a implementação de estratégias genuinamente sustentáveis de desenvolvimento humano.



Referências

OST, F. (1995). A natureza à margem da lei: a Ecologia à prova do Direito. Lisboa: Instituto Piaget.

SACHS, I. (1993). Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Nobel & Fundap.



*aluno da pós-graduação em Educação, Ambiente e Sustentabilidade | e-Learning | Universidade de Évora

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