Ciência no Feminino



 
À Ciência no Feminino bem podem aplicar-se as palavras de António Machado: “Caminante, no hay camino, se hace camino al andar”. A Ciência e a Tecnologia foram, desde tempos imemoriais, campos de saber governados por homens. A mulher, delicada e sensível, foi remetida para as áreas onde poderia mais facilmente desenvolver as suas capacidades naturais, como a educação e as artes. Porém, neste contexto masculino, muitas mulheres usando a sua criatividade e inteligência, desenvolveram ideias, criaram produtos e deram resposta às questões suscitadas pelo mundo que as rodeava, conquistando o respeito dos seus pares masculinos. No decurso da História, muitas destas mulheres admiráveis foram esquecidas enquanto de outras chegou até nós algum registo.
Maria Goeppert-Mayer (1906, Alemanha – 1972, EUA) é um exemplo de alguém com uma tenacidade extraordinária na prossecução dos seus objectivos. Famosa nos anos 60 do séc. XX pelo seu trabalho sobre a estrutura do átomo e pelo qual foi laureada com o prémio Nobel da Física (1963), trabalhou a partir de 1930, já doutorada, durante mais de uma década e meia como voluntária em laboratórios onde a sua presença foi apenas tolerada por respeito ao seu marido. Outro exemplo é o de Lise Meitner (Áustria, 1878 – Inglaterra, 1968), física que desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento da fissão nuclear, em conjunto com Otto Hahn, e que foi excluída do prémio Nobel atribuído a este último (1944) por questões discriminatórias de raça e de sexo. Exemplo da discriminação que pautou a vida de Meitner foi o episódio com o título da sua conferência em Berlim "Problems of Cosmic Physics", referenciada pela comunicação social como "Problems of Cosmetic Physics".
Porém, há também casos de mulheres que desde jovens desempenharam papéis fundamentais e reconhecidos na sociedade em que viveram. Hipátia de Alexandria (Alexandria, 355? – 415 d.C.) é provavelmente uma das figuras mais românticas no mundo da ciência. Era filha de Teão, figura eminente no seu tempo. Estudou em Atenas e, de regresso à sua cidade natal, tornou-se professora de matemática e de filosofia na conceituada Academia de Alexandria. Oradora carismática, é-lhe atribuída a autoria de três grandes tratados sobre geometria e álgebra e um sobre astronomia. Concebeu vários instrumentos, entre eles, o astrolábio. Hipátia fez parte do número dos últimos intelectuais conhecidos a trabalhar na Biblioteca de Alexandria e alcançou com a sua genialidade o estatuto de primeira mulher matemática da História.
Exemplo de sucesso reconhecido é também o de Manya Sklodowska (Polónia, 1867 – França, 1934), a Madame Curie, seguramente a mulher responsável pela viragem observada na História da Ciência durante o séc. XX. Licenciada em matemática e física, foi a primeira Doutora em Ciências na Europa. Marie Curie foi a única laureada duas vezes com o prémio Nobel: foi-lhe atribuído em 1903 o Nobel em Física, em parceria com Pierre Curie e Henri Becquerel, pela descoberta dos elementos químicos rádio e polónio, e em 1911 recebeu o Nobel em Química pelo isolamento do rádio puro. Durante a Primeira Guerra Mundial, com o auxílio de Irene, sua filha que também viria a receber o Nobel em Química em 1935 pelos seus estudos sobre a radioactividade artificial, dedicou-se ao desenvolvimento da radiografia móvel para o tratamento de soldados feridos. O trabalho do casal Curie e, particularmente de Marie, conduziu a progressos importantes nas áreas da física e química, mas também da medicina e biologia. Através do uso da radiação, um novo campo da medicina foi gradualmente emergindo: a radioterapia.
Nos tempos difíceis que nos cabe viver, o exemplo destas mulheres é um grito ao conformismo, cristalizado nas palavras de Marie Curie: “A vida não é fácil para ninguém. E daí? Devemos ter perseverança e acima de tudo confiança em nós próprios. Devemos acreditar que temos um dom para alguma coisa e que esse objectivo deve ser atingido.”


Fontes consultadas
Universidade do Alabama, <http://www.astr.ua.edu/>
Prémios Nobel, <http://www.nobelprize.org>
Instituto Curie, <http://www.curie.fr>
Famous Scientists, <http://www.famousscientists.org>
Ruth Sime, Lise Meitner: A Life in Physics, University of California Press, 1996, consultado em  <http://dannyreviews.com/>

Por
Teresa Ferreira*

* Prof. Dep. Química da ECTUE e Centro de Química de Évora (CQE)

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