Breve História da Tabela Periódica...Revisitada

Em sciencenotes.org

O Ano de 2019 foi proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas e pela UNESCO como o Ano Internacional da Tabela Periódica(IYPT2019), celebrando assim os 150 anos desde que foi publicada pelo químico russo Dimitry Mendeleiev, no jornal da Sociedade Russa de Química, com os 63 elementos conhecidos à data. É a oportunidade para revisitar e actualizar o texto que foi publicado neste espaço em 2011 sobre a Breve História da Tabela Periódica, no contexto das comemorações do Ano Internacional da Química ocorridas nesse ano.

Introdução
Apesar dos parcos conhecimentos de Química que cada um possa ter, com certeza que já ouviu falar da Tabela Periódica, uma disposição sistemática de elementos químicos em função das suas propriedades. Como surgiu a Tabela Periódica actual? É a esta pergunta que se procura responder nas linhas seguintes onde se pretende fazer uma Breve História da Tabela Periódica.
Um pré-requisito necessário para construção da Tabela Periódica foi a descoberta individual dos elementos químicos. Embora vários elementos fossem conhecidos desde a antiguidade, nomeadamente o ouro, a prata, o estanho, o ferro e o cobre, a primeira descoberta dita científica de um elemento ocorreu em 1669 quando o alquimista Henning Brand descobriu o fósforo. A partir daí, muitos outros elementos foram sendo descobertos e o conhecimento relativo às suas propriedades físicas e químicas foi aumentando. Antes de 1800 eram conhecidos 34% dos elementos actualmente existentes, no século XIX a percentagem aumentou para cerca de 75% e no século XX descobriram-se os seguintes. Através da percepção da existência de algumas regularidades no comportamento dos elementos até então descobertos, os cientistas começaram a procurar modelos para reconhecer as suas propriedades e desenvolver esquemas para a sua classificação e ordenação.


A ordenação de John Dalton
No início do séc. XIX John Dalton, um químico e físico inglês, listou os elementos, cujas massas atómicas eram conhecidas, por ordem crescente de massa atómica, cada um com as suas propriedades e seus compostos. Não houve uma tentativa de efectuar qualquer arranjo ou modelo periódico dos elementos. Facilmente se constatou que a lista não era esclarecedora: vários elementos que tinham propriedades semelhantes (halogéneos, por exemplo) tinham as suas massas atómicas muito separadas.


John Dalton
(1766-1844)
Símbolos químicos de Dalton



As tríades de Johann W. Döbereiner

Em 1829, Johann W. Döbereiner, professor de Química na Universidade friedrich Schiller de Jena (Alemanha), teve a ideia de agrupar os elementos em três, ou tríades. As tríades estavam separadas também pelas massas atómicas, mas com propriedades químicas muito semelhantes. A massa atómica do elemento central da tríade seria supostamente a média das massas atómicas do primeiro e terceiro elementos. Esta ideia tornou-se relativamente popular nessa época. No entanto, nos 30 anos seguintes, vários cientistas constataram que, para vários elementos, estes tipos de relações químicas se estendiam para além da tríade. Infelizmente, a investigação nesta área foi prejudicada pelo facto dos valores rigorosos das massas atómicas nem sempre serem conhecidos.

 

Johann W. Döbereiner (1780-1849)
 



Lei das Tríades de Döbereiner










O cilindro (ou parafuso telúrico) de Chancourtois
O primeiro esboço de periodicidade dos elementos deve-se provavelmente ao geólogo francês Alexander Emile Beguyer de Chancourtois. Em 1862 Chancourtois propõe uma classificação dos elementos pela sua disposição na superfície de um cilindro. Os elementos dispunham-se sobre uma linha diagonal formando um ângulo de 45° com a horizontal, desenhando uma espiral e estavam ordenados por ordem crescente de massa atómica (em números inteiros) de forma que os que tinham propriedades semelhantes se situavam na mesma linha vertical. Assim, deu-se conta que as propriedades dos elementos eram uma função da sua massa atómica o que o levou a propor que "as propriedades dos elementos são as propriedades dos números." De Chancourtois foi o primeiro a reconhecer que propriedades semelhantes reaparecem a cada sete elementos e usando este esquema foi capaz de prever a estequiometria de vários óxidos metálicos. Infelizmente, o sistema era complexo pois incluía também compostos. A sua proposta não foi muito conhecida e divulgada porque o esquema era relativamente complexo.


Alexander de Chancourtois (1820-1886)
Cilindro de Chancourtois


Lei das Oitavas de Newlands
Em 1863, John Alexander Reina Newlands, químico industrial inglês e professor de química no City College em Londres ordenou os elementos por ordem crescente de massa atómica e constatou que um dado elemento apresentava propriedades semelhantes ao oitavo elemento a contar a partir dele. A esta relação Newlands chamou a “Lei das Oitavas”, que dizia ser uma espécie de repetição por analogia com as oitavas da escala musical (Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si,…Dó,…). O principal problema com que Newlands se deparou foi o de que a sua lei apenas funcionava correctamente para as duas primeiras oitavas, na terceira e nas seguintes não se verificava. Apesar de ter sido ridicularizado pela Sociedade de Química de Londres, Newlands sugere, com a Lei das Oitavas, uma classificação sistemática onde começa a surgir o princípio envolvido na actual classificação dos elementos.


John Newlands
(1837-1898)





Lei das Oitavas de Newlands



Tabela de Lothar Meyer e Mendeleiev
Em 1864 Julius Lothar Meyer, químico alemão, estudou a relação existente entre o volume atómico dos elementos e as respectivas massas atómicas. Representou graficamente o volume atómico em função da massa atómica relativa e, através da curva obtida, conseguiu agrupar vários elementos em famílias. Chegou assim a uma classificação periódica dos elementos que tinham propriedades semelhantes, um esboço da tabela periódica actual. Mais ou menos por essa altura, Dimitri Ivanovitch Mendeleiev, químico Russo, enquanto escrevia um livro de química inorgânica, também procurou organizar os elementos de acordo com as suas propriedades. Mendeleiev criou uma carta para cada um dos elementos conhecidos. Cada carta continha o símbolo do elemento, a massa atómica e as suas propriedades químicas e físicas. Colocando as cartas numa mesa, organizou-as por ordem crescente das suas massas atómicas, agrupando-as em elementos com propriedades semelhantes, ou seja, listou os elementos de uma linha ou coluna por ordem de massa atómica, iniciando uma nova linha ou coluna quando as propriedades dos elementos se começavam a repetir. Formou-se assim, tal como obtido por Lothar Meyer, o esboço da tabela periódica actual. A vantagem da tabela periódica de Mendeleiev sobre outras é que esta exibia semelhanças, não apenas em pequenos conjuntos, como as tríades. Mostravam semelhanças numa rede de relações vertical, horizontal e diagonal. Uma das razões para o sucesso da tabela foi o de deixar lacunas quando parecia que o elemento correspondente ainda não tinha sido descoberto. A partir daqui Mendeleiev conseguiu prever algumas propriedades de elementos químicos que ainda não haviam sido descobertos na sua época. Outra razão foi ocasionalmente ignorar a ordem sugerida pelas massas atómicas e alternar alguns elementos adjacentes para melhor classificá-los em famílias químicas. Com o desenvolvimento das teorias da estrutura atómica verificou-se à posteriori que Mendeleiev tinha, inadvertidamente, ordenado os elementos por ordem crescente de número atómico. O trabalho de Mendeleiev foi amplamente aceite, sendo assim considerado o pai da tabela periódica actual. No entanto, de forma justa, tanto ele quanto Lothar Meyer deveriam ser considerados os verdadeiros pais da actual classificação periódica. O azar de Meyer foi que em 1868 construiu uma tabela alargada dos elementos e entregou a um colega para avaliação. Enquanto isso, Mendeleiev deu a conhecer a sua tabela à comunidade científica através de publicação em 1869, enquanto que a de Meyer veio a conhecimento apenas em 1870...



Julius Lothar Meyer
(1830-1895)



Tabela dos elementos de J. L. Meyer




Dimitri Ivanovitch Mendeleiev
(1834-1907)





Tabela dos elementos de Mendeleiev




A Tabela Periódica actual 
Embora a tabela de Mendeleiev/Meyer tenha demonstrado a natureza periódica dos elementos, apenas no séc. XX foram encontradas explicações para as razões das propriedades dos elementos variarem periodicamente. O desenvolvimento, nomeadamente dos modelos atómicos e teoria quântica, permitiram racionalizar o conhecimento das propriedades dos elementos e chegar à configuração da actual tabela periódica. Esta foi ampliada ao longo do tempo, à medida que novos elementos foram sendo descobertos. A tabela actual contém 118 elementos, dispostos em linhas horizontais (períodos) e verticais (grupos), por ordem crescente de número atómico. As linhas horizontais são dispostas de modo que os elementos com propriedades semelhantes fiquem nas mesmas colunas (grupos ou famílias). O grupo é considerado o mais importante método de classificar os elementos. Em alguns grupos, os elementos têm propriedades muito semelhantes e exibem uma tendência clara nas propriedades ao longo do grupo. A estes grupos foram dados nomes triviais, por exemplo, os metais alcalinos, metais alcalinos terrosos, halogénios, gases nobres, etc. Alguns outros grupos na tabela periódica mostram menor grau de semelhanças/tendências verticais e são referidos simplesmente pelo seu número de grupo. Embora os grupos sejam a forma mais comum de classificação de elementos, existem zonas da tabela periódica onde as tendências horizontais e semelhanças nas propriedades são mais significativas do que as tendências verticais. Na Tabela Periódica, cada elemento é apresentado, nomeadamente, com o seu símbolo e número atómico. Muitas versões da tabela apresentam também outras propriedades atómicas e propriedades físicas. Ao longo do séc. XX foram aparecendo representações alternativas da Tabela Periódica, principalmente por razões didácticas. No entanto, a Tabela Periódica “tradicional” que é a que conhecemos mantém-se como a representação aceite da disposição sistemática dos elementos químicos em função das suas propriedades. Na sequência da descoberta recente dos elementos 113, 115, 117 e 118 da Tabela Periódica, a IUPAC publicou uma notícia em Junho de 2016, em que divulgava, para escrutínio público, os nomes em língua inglesa propostos pelos respectivos descobridores: Nihonium (símbolo Nh), para o elemento 113 (provisoriamente: unúntrio, Uut); Moscovium (símbolo Mc), para o elemento 115 (provisoriamente: unumpêntio, Uup); Tennessine (símbolo Ts), para o elemento 117 (provisoriamente: ununséptio, Uus); Oganesson (símbolo Og), para o elemento 118 (provisoriamente: ununóctio, Uuo). Estas designações em inglês vieram a ser confirmadas pela IUPAC em Novembro de 2016. A necessidade de fixar na base terminológica IATE (Inter-Active Terminology for Europe) dos serviços linguísticos das instituições europeias as designações em português, e a correspondente ortografia, dos novos elementos, levou a que fossem propostas, e depois aprovadas, seguintes designações: Nipónio, para o elemento 113; Moscóvio, para o elemento 115; Tenesso, para o elemento 117; e Oganésson, para o elemento 118.




A Tabela Periódica actual (Fonte: SPQ)



Conclusão

A Tabela Periódica é agora omnipresente fornecendo um enquadramento útil para classificar, sistematizar e comparar as muitas formas diferentes de comportamento químico. É uma das conquistas mais importantes e com maior influência da ciência moderna, tendo encontrado muitas aplicações não apenas em Química, mas também na Física, Biologia, Engenharia e Ciência dos Materiais e em outras áreas das ciências puras.

Paulo Mendes









Sem comentários:

Enviar um comentário